Na batalha há quase 25 anos, os
cearenses da Obskure representam hoje uma das maiores forças do Death Metal com
passagens melódicas do país. Em 2012, soltaram o fabuloso “Dense Shades of Mankind” (resenha aqui),
um verdadeiro marco no underground nacional. Ainda em fase de divulgação, como
contam os irmãos Amaudson Ximenes (guitarra) e Jolson Ximenes (baixo), o álbum
foi lançado com recursos de um edital. Sobre isso e outros detalhes do disco,
eles falaram ao blog Som Extremo.
Este
é o segundo ‘full length’ da Obskure, sendo que o primeiro, “Overcasting”, saiu
em 1997. Vocês lançaram alguns materiais nesse meio tempo, mas somente em 2012
soltaram “Dense Shades of Mankind”. Por que levou esse grande intervalo entre
um e outro?
Amaudson Ximenes: As constantes mudanças de formação impediram que lançássemos o segundo álbum com um menor espaço de tempo. Era para ter saído um segundo em 2001, mas foi quando o Daniel Boyadjian deixou a banda pela primeira vez. Nesse intervalo, tínhamos uma agenda de shows para cumprir, algumas coletâneas e optamos por fazê-los. Mesmo assim, escrevemos algumas composições que estão presentes no novo álbum. Em 2005, entrou para o grupo Rafael Basso, que morava em João Pessoa/Paraíba, a cerca de 700 quilômetros de Fortaleza (atualmente reside na Suécia). A distância também dificultou bastante a continuidade do trabalho, mesmo assim fizemos alguns shows importantes como duas edições do ForCaos e shows na região metropolitana de Fortaleza, interior do Estado do Ceará e cidades do Nordeste, como Natal. Em 2006, a formação foi estabilizada e permanece até hoje.
Ligada
à primeira pergunta, o novo trabalho levou quase três anos e meio – dezembro de
2007 a março de 2011 – para ser concluído, e mais quase um ano para ser
lançado. Por quê?
Amaudson: Problemas
com a gravação. O estúdio mudou de endereço. No novo espaço, as salas eram bem
maiores do que as anteriores. A sonoridade e acústica também eram superiores.
Não deu outra, regravamos tudo. Só mantivemos a bateria. Também foi um período
de mudanças de endereço do nosso vocalista por conta de trabalho, acabou indo
residir no interior do estado, bem como nascimento de filho do nosso
guitarrista. E por fim, quando tudo parecia se encaminhar para o “final feliz”,
as artes do CD foram perdidas. Uma grande chuva caiu em São Paulo, danificando
o HD do Gustavo Sazes, que refez tudo novamente.
O
trabalho tem repercutido positivamente entre fãs e mídia especializada.
Sinceramente, vocês imaginavam um retorno tão grande?
Amaudson: Existe uma ferramenta de divulgação chamada rede social, que acabou nos surpreendendo positivamente. Além de encontrarmos amigos do passado e do presente, fanzines e revistas, fez com que pudéssemos amplificar positivamente a divulgação do novo trabalho. Surpresa boa e positiva.
O
Death Metal com veias melódicas do grupo continua grandioso como poucas bandas
aqui no Brasil. Vocês consideram “Dense Shades of Mankind” o melhor lançamento
da Obskure até o momento?
Amaudson: Foi o que pudemos fazer de melhor e o que estava ao nosso alcance naquele momento.
Há
participações especiais de Marcelo Barbosa (Almah), Claudine Albuquerque e
Daniel Boyadjian. Como foi a experiência?
Amaudson: O Daniel Boyadjian é membro titular da banda desde 1992, apesar das idas e vindas. A Claudine Albuquerque, nós conhecemos no circuito de bares de Fortaleza, ela cantava em algumas bandas locais. Hoje possui um trabalho autoral com sua banda, a Nafandus. Na música que ela faz participação já havíamos experimentado outro vocal feminino, numa gravação de 2001. E como a música entrou para CD, mantivemos o arranjo dos vocais e a voz dela se encaixou bem. Inclusive fez algumas participações em shows da banda. O Marcelo Barbosa tocou aqui duas vezes com o Khallice (DF) no ForCaos, evento organizado pela Associação Cultural Cearense do Rock, da qual que faço parte. Produzi também alguns workshops dele aqui. E num desses encontros mostramos a música para ele e fizemos o convite. Mandamos a base para ele, que foi gravada em Brasília e enviada no período da mixagem.
Gustavo
Sazes assina o trabalho gráfico de “Dense Shades of Mankind”, sendo o conceito
da capa elaborado por ele e pela banda. Como foi o processo até chegar ao lindo
resultado?
Amaudson: Tínhamos diversas recomendações de amigos que fizeram trabalhos com ele, e resolvemos procurá-lo. No primeiro contato, enviamos as letras e a ideia do que queríamos. Passamos uns dois meses discutindo o formato até chegar ao resultado, cujo produto final chegou durante a mixagem do CD. Mas como havia dito anteriormente, ele teve que refazer tudo por conta do “dilúvio” que caiu em São Paulo no período e danificou seu equipamento. O trabalho acabou saindo mais bonito que o anterior.
Para
sua produção, o disco recebeu um prêmio do edital de incentivo à música, da
prefeitura municipal de Fortaleza. Como foi essa conquista? Esse tipo de
incentivo tem se tornado mais comum em relação a bandas de música extrema? Pergunto
isso porque os novos da Siege of Hate e da Krow receberam premiações
semelhantes.
Amaudson: A prática de editais públicos é relativamente nova. É uma forma que os governos encontraram de apoiar a cultura de forma isenta e impessoal, e que precisam ser acessados quando lançados nos respectivos estados e cidades. Como você falou, outros grupos também lançaram mão desse recurso para produzirem seus trabalhos, viabilizarem livros, CDs, turnês etc e acabaram descobrindo que dá certo. É dinheiro público, dinheiro dos nossos próprios impostos. Se você não acessa, vem outro e o faz.
Lançar
o material em formato digipack (lindíssimo) e ainda colocar o videoclipe de
“Christian Sovereign” só foi possível devido ao edital, ou tudo sairia dessa
maneira de qualquer jeito?
Amaudson: Ajudou bastante a viabilizar, porque não tivemos que tirar verba do bolso nem esperar que algum selo ou gravadora interessada o fizesse. É um recurso que precisa ser ampliado em pequenas, médias e grandes cidades do Brasil.
Lembro-me
que conheci a banda por meio de um CD da extinta revista Planet Metal, se não
me falhe a memória, nos anos noventa, e nunca esqueci a sonoridade de vocês. Ao
ouvir o novo disco, tive a impressão de que a qualidade continua intacta. Como
é manter a mesma proposta por quase 25 anos?
Amaudson: A proposta é sempre exigir o melhor de cada um de nós. Estamos sempre buscando extrair o melhor de cada um dos integrantes.
Aliás,
vocês são um dos primeiros no Brasil a inserir o teclado na sonoridade brutal que
executam, certo? Como surgiu essa ideia, na época?
Jolson Ximenes: Foi na nossa demo-tape “The Singing Of Hungry” (1993). Sempre gostamos da possibilidade sombria e rica que o teclado trazia à música pesada, então quando tivemos a oportunidade de experimentar nesse trabalho. Ficamos enormemente satisfeitos com o resultado e imediatamente convidamos uma grande amiga (Cristiane Rocha) que estudava o instrumento, para se juntar à banda, e de lá pra cá, o teclado é parte marcante na identidade sonora produzida pelo Obskure.
Dentro
de todo esse período, vocês contam com inúmeros materiais, entre demos, EP e
DVD, mas, como mencionado, são somente dois álbuns completos. Quais têm sido as
grandes dificuldades em lançar mais ‘full’?
Jolson: Já se vão quase 25 anos de trajetória e “apenas” dois álbuns lançados. Em resumo, classificamos que essa demora em lançar novos discos se divide em dois problemas: para o primeiro registro, “Overcasting”, a nossa dificuldade era de estrutura e verba, precisávamos de uma gravadora que viabilizasse esse processo, até então muito caro e dificultoso para uma banda independente na década de 90 percorrer e arcar sozinha. Pro segundo disco, “Dense Shades Of Mankind”, a dificuldade em manter uma formação estável foi o principal fator na demora do primeiro para o segundo álbum. Tivemos inúmeras mudanças e isso atrapalhou bastante o fechamento do disco para que entrássemos em estúdio.
Por
favor, corrijam-me se eu estiver errado, mas vocês são os únicos membros da
formação original. Para os dois, qual é o lado positivo das trocas de
integrantes ao longo dos anos?
Jolson: Nessas duas décadas, tivemos muitas entradas e saídas de integrantes, e sem dúvida alguma o fator mais positivo é você poder trabalhar com gente nova, com perfis diferentes, ideias, temperamentos, pontos de vistas diversos, o que torna o trabalho mais desafiador e enriquece o processo criativo, porque cada um chega com um lado positivo diferenciado. E era justamente esse “melhor” que cada um trazia ao Obskure, que era extraído. De maneira prática, a criação dos arranjos e interpretações das músicas eram constantemente adequados à formação vigente, ora mais melódico, sombrio, direto, pesado e por aí se seguia, desbravando as novas influências agregadas.
“Dense
Shades of Mankind” saiu no início de 2012. Já estão compondo novo material ou
ainda estão na fase da divulgação do disco? Dentro disso, há previsão para o
lançamento de mais algum videoclipe?
Amaudson: Continuamos a divulgar o “Dense Shades of Mankind”. Temos alguns shows agendados para esTe ano em Fortaleza e para o ano que vem também. E intensificando contatos para fecharmos também no interior do Ceará, onde a cena cresce e se desenvolve rapidamente, além de contatos com outras regiões do país. Para o ano de 2014, planejamos produzir um segundo videoclipe, bem como um documentário sobre os 25 anos da banda. Já tenho alguns escritos para as próximas letras, mas ainda falta nos reunirmos para iniciar as composições do próximo trabalho.
Jolson: O processo de composição ainda permanece individualizado, isso é, cada um compondo seus novos riffs e temas, e escrevendo livremente para posteriormente, quando esgotarmos a divulgação do “Dense Shades...”, nos voltarmos para preparação do seu sucessor. Contudo, gravar pelo menos mais um videoclipe é um desejo imediato para o grupo e de certa forma ainda está diretamente ligado a esse segundo álbum, que será trabalhado até o julho de 2014.
A
demo “Uterus And Grave” está sendo relançada em vinil em um split junto com a
demo “Confused Mind”, da No Sense. Como surgiu essa oportunidade? Como é ter
material do início da carreira relançado, o que certamente evidencia a
importância da banda no cenário nacional?
Amaudson: O relançamento do material foi mais uma aposta Winter Productions, da Alemanha, que já havia relançado a nossa segunda demo-tape, “Opressions in Obscurity”, (1992) em vinil em 2012. Na época do lançamento, “Uterus and Grave” (1990) teve boa repercussão junto a revistas e fanzines do gênero. Houve conversas com selos e gravadoras, mas não evoluíram naquela época. Presentemente, ter esse material novamente trazido à lembrança e lançado vinte de quatro anos depois é uma honra para nós e também um reconhecimento. E com o No Sense nessa empreitada, só referencia ainda mais esse trabalho, por se tratar uma banda histórica e representativa da cena extrema brasileira. A sugestão foi conjunta do Obskure e do Juliano (Winter Productions), que conhecia os dois trabalhos.
E
falando em No Sense, a vocalista Marli subiu ao palco e berrou com vocês no
tradicional ForCaos neste ano. Como foi isso? E como foi, de modo geral, a
atuação de vocês no evento?
Amaudson: A Marly é nossa contemporânea da cena do final dos anos de 1980 e início dos anos noventa. Era nossa correspondente, quem respondia as correspondências do No Sense. O reencontro foi possível através da rede social em 2011. Em 2012, ela esteve em Fortaleza participando de uma das mesas do seminário ForCaos sobre a participação da Mulher no Rock e no Metal, e acabou fazendo uma participação em nosso show durante o evento. Este ano (2013), ela veio cobrir o evento para a revista Rock Brigade e acabou participando novamente. Participação animal, diga-se de passagem. Grande vocalista, grande carisma e grande amiga. Esperamos em breve ter a banda completa em Fortaleza no lançamento desse material histórico. Temos trabalhado bastante para que esse evento ocorra por aqui, e quiçá, também no estado de São Paulo.
Agradeço
a entrevista! Por favor, deixem um último recado.
Amaudson: Muito
obrigado pelo espaço e pelo apoio.